Novos Termos de Serviço da PSN nos lembra dos males da mídia digital
Na semana passada, vários jogadores de PlayStation encontraram em algum momento um novo Termos de Serviço que era necessário confirmar sua compreensão e concordância para reaver acesso ao console e jogos. Como de costume, os detalhes importantes estão enterrados em pilhas de linguagem legal que a maior parte de seu público não tem como analisar ou compreender a fundo, mas aceitamos do mesmo jeito já que precisamos fazer isso para acessar nossos jogos. Porém, nesses termos há um lembrete de que, apesar dessa nova geração de videogames oferecer opções sem leitor de disco, nós não estamos nada prontos para normalizar a mídia digital. Um advogado e youtuber Richard Hoeg leu detalhes desses termos e ressaltou alguns pontos que julgou importante o consumidor saber. Com isso temos:
Nada de ações coletivas
A primeira mudança é intrisecamente ligada a forma que a lei opera nos Estados Unidos, ao aceitar os termos você abdica seu direito de processar diretamente a Sony, incluindo ações coletivas onde várias pessoas processam a mesma empresa pelo mesmo motivo, ao invés disso qualquer ação legal tem que ser feita através de arbitragem, que é decidida por terceiros fora do processo comum da corte. Isso não afeta a vida dos jogadores brasileiros diretamente, mas com essa proteção fica extremamente improvável que até mesmo americanos façam qualquer ação legal contra a Sony, o que pode acarretar na empresa sendo um pouco mais relaxada quanto os direitos do consumidor.
Política de Privacidade
Dentre as várias mudanças, a política de privacidade da empresa também foi reescrita e incluída nos Termos de Serviço. A Política de Privacidade diz que, de forma simplificada, a Sony reserva o direito de coletar toda e qualquer informação que seja inserida através de um PlayStation ou através dos serviços da PSN ou SIE. Apesar de ser abrangente, tal direito é necessário para que o sistema possa operar normalmente, caso esses direitos não fossem explícitos, a simples ação de mandar uma mensagem para um amigo poderia trazer problemas legais para a Sony. Porém o que preocupa nessa parte em específico são os direitos que eles reservam de como manipular esses dados coletados, já que podem ser compartilhados com parceiros de marketing e promoções.
Em outras palavras, suas informações não serão exatamente vendidas, mas qualquer marca que tiver uma campanha de marketing em conjunto com a PlayStation poderá fazer uso desses dados para lhe entregar propagandas de produtos que você mencionou ennquanto usava qualquer serviço deles. É possível optar para que não usem seus dados para esse propósito, mas não será a opção padrão.
Criações de contas
Toda e qualquer informação ao criar uma conta tem que ser correta, caso contrário a Sony pode cancelar/deletar a conta a qualquer momento. O que isso influencia de forma mais direta, é a pratica de criar contas através de VPNs ou similares para comprar jogos disponíveis em outros países ou pegar um preço melhor. Todos os jogos comprados através dessa conta serão perdidos.
Além do mais, eles reservaram o direito de negar a criação de uma nova conta por qualquer motivo a discrição deles. Apesar de que o provável motivo que essa cláusula tenha sido adicionada seja para impedir a criação de contas quando algum jogo está de graça em determinada região (exemplo: quando Mafia 2 estava disponível de graça na Malásia), esse termo é vago demais e dá autonomia demais a Sony, o que pode ser abusado e ainda estar protegido por fazer parte dos Termos.
Controles parentais
Uma nova forma de controle parental é uma Conta de Criança. Essa conta por padrão não pode comprar nada, porém é possível adicionar um limite de fundos para ser gasto mensalmente através dessa conta. Essa cláusula também faz com que os pais sejam responsáveis por quaisquer gastos feitos por seus filhos, ou seja, casos onde crianças gastaram milhares em microtransações não poderão ser usados como argumentos legais em qualquer processo contra a Sony ou PlayStation. Não há nada tão abusivo nessa parte, mas é essencial que pais tomem mais cuidado com o que seus filhos fazem nos consoles pois a Sony se reserva no direito de não reembolsar qualquer valor gasto acidentalmente.
Código de conduta
Ofensas e discriminação
Aqui tem uma cláusula provavelmente bem intencionada com o objetivo de limitar quaisquer ações discriminatórias e/ou potencialmente tóxicas para a comunidade. Porém da forma que foi elaborada, ela pode ser muito mal utilizada. Até mesmo amigos jogando algum jogo de luta e xingando um ao outro caem na abrangente definição de assédio desses termos de serviço. É claro, é extremamente improvável que a Sony irá tomar ação em casos benignos como esse, mas eles ainda possuem o direto de cancelar sua conta junto com todas as suas compras caso você algum dia xingou qualquer outra pessoa usando os serviços da PSN ou SIE, independente se é seu amigo, se foi intencionalmente malicioso ou não, ou até se a outra pessoa realmente se sentiu ofendida.
Compartilhamento de informações e contas
Divulgação de qualquer informação pessoal, seja sua ou de outra pessoa, é estritamente proibida. O simples compartilhamento de um e-mail é uma ofensa banível (apesar de que realmente é bom senso de não compartilhar tais informações com desconhecidos). Além do mais, o compartilhamento de contas também é uma ofensa banível.
Trapaças, bugs e exploits
O uso de quaiquer desses métodos também se torna proibido. Apesar de faça perfeito sentido em um contexto multiplayer, novamente sua ambiguidade faz com que muito mais do que ações prejudiciais possam ser punidas. Por exemplo, o uso do famoso glitch de Oghma Infinium em Skyrim é considerado uma violação do código de conduta, e poderia ser usado para terminar a conta de alguém. Vale relembrar, é improvável que eles realmente irão fazer algo contra tais “violações” benignas pois isso só traria más relações públicas para eles, mas também é perfeitamente possível que eles o façam se por qualquer motivo julgarem necessário.
Tratamento dos funcionários?
Como uma cláusula incomum nesse tipo de documento, há um parágrafo que dita que “não seja rude a nossos funcionários, agentes, ou representativos”. Além das punições customárias, uma violação dessas ainda poderá acarretar em restrições nas formas de contato com a empresa e quaisquer canais de suporte.
É claro, idealmente sempre devemos ser cordiais. Porém idealmente também jamais precisariamos contatar o suporte por erros de cobrança, contas hackeadas, ou qualquer problema técnico fora do nosso alcance. Quem já teve que contatar o suporte da PlayStation sabe que a chance de seu problema ser consertado depende muito de quem te atende, e não é impossível imaginar alguém perdendo a paciência depois de ser mal atendido e/ou ter seu problema ignorado, além de que a definição de “rude” está completamente nas mãos da Sony. As punições para essa cláusula em específico traz um precedente novo para esses termos que é impossível de prever como será usado.
Conteúdo de usuários
Empresas geralmente colocam algumas cláusulas de redistribuição de conteúdo gerado por usuários. Plataformas como o Twitter por exemplo, precisa adquirir direitos de redistribuir seja lá o que qualquer usuário esteja postando para que funções como RTs possam existir. Geralmente a forma que se é redigido esses documentos parece assustador para quem não trabalha com a lei, mas geralmente não pode ser abusado. Aqui porém, a linguagem está incompleta e não há nada que proteja o usuário caso a Sony use qualquer conteúdo de usuários e o monetize. Além do mais, esses direitos se extendem a quaisquer terceiro que colabore com a Sony/PlayStation. Ou seja, é melhor evitar quaisquer serviços da PSN para se enviar qualquer conteúdo. Nessa era onde a privacidade digital parece cada vez mais invadida, esses termos são preocupantes.
Além do mais, streaming através de seus próprios servições de Share exige que a pessoa tenha os direitos para fazer isso da desenvolvedora/editora. Novamente, é improvável que esses termos sejam constantemente fiscalizados, mas não há nenhuma forma de proteção para o usuário aqui.
Reembolsos
Não é uma mudança exatamente, mas ainda vale lembrar que eles se reservam no direito de negar qualquer pedido de reembolso independente se a compra foi autorizada ou não. Ou seja, caso a sua conta seja hackeada e seus dados estiverem atrelados a conta, qualquer compra feita por terceiros através de meios ilícitos ainda não lhe garante o direito a reembolsos. Um lembrete para jamais deixar informações de cartões em seu console, pois a Sony se reserva ao direito de não lhe reembolsar independente do que aconteça.
Resumidamente:
De forma geral, boa parte dos termos estão dentro da média do que essas coisas geralmente são, mas isso só ressalta o problema de que nós estamos movendo para uma geração com ainda mais foco em mídia digital sem quaisquer proteções para os consumidores. A discussão de propriedade de jogos digitais é uma das mais importantes da situação atual da indústria, e conforme as empresas estão ditando as regras, é mais necessário do que nunca se conscientizar do que estamos concordando cada vez que nos mostram um novo Termos de Serviço para assinar…