Scarlet Nexus – Potencial inexplorado
Jogos de anime da Bandai já tem uma certa fama distinta. Entre os vários jogos de franquias licenciadas como Dragonball, One Piece ou Naruto de vez em quando lançam um jogo com estética de shounen mas com uma nova propriedade intelectual específica para isso. God Eater foi um dos primeiros, usando a fórmula de Monster Hunter com mais ação. Depois Code Vein usando uma fórmula mais soulslike. Scarlet Nexus é a próxima aposta em um novo projeto, anunciado junto com um anime tradicional.
Dessa vez o gênero puxa mais para um RPG de Ação mais tradicional. Muito de seu design é reminescente de jogos como .hack, Dark Cloud, Kingdom Hearts, Radiata Stories ou outros RPGs da sexta geração. Em meio a uma superabundância de jogos de mundo aberto e/ou foco cinemático, seu ritmo mais tradicional acaba sendo uma boa mudança de ritmo e uma dose de nostalgia. O jogo é separado em 12 capítulos onde se explora um mapa linear e há uma fase de “standby” no final de cada capítulo permitindo revisitar mapas seja para ganhar dinheiro, XP, ou materiais para novas armas ou equipamentos.
Quanto ao combate em si, suas habilidades têm poucas variações dependendo de qual protagonista o jogador escolhe (Yuito ou Kasane), mas ambos seguem o mesmo princípio de poderes telekinéticos. As habilidades base são combos variando entre ataques rápidos ou em área e intercalando com a telecinese jogando objetos, a mecânica é intuitiva e bem explicada. Com o passar do jogo são introduzidas novas mecânicas como o compartilhamento de habilidades através do SAS e uma árvore de habilidades para expandir suas opções. De começo a fim o jogo não se torna repetitivo ou cansativo, tendo um ótimo ritmo e curva de dificuldade com poucos erros na duração de sua campanha que varia entre 20 a 30 horas.
O maior erro na jogabilidade é seu lock-on que muitas vezes seleciona um alvo incorreto e requer uma combinação de botões incomum para trocar de alvos. Perto do final onde é necessário priorizar inimigos de acordo com a ameaça é comum ter o lock-on travando em um inimigo fraco que desvia sua atenção e te coloca numa sequência de ataques que podem levar a um insta-kill. A velocidade da câmera também não tem uma curva de aceleração boa, sempre sendo muito lenta ou muito rápida. Não é frequente que esses problemas acontecem, mas as poucas vezes que acontece é frustrante o suficiente para ser perceptível. No que se trata de controles também, o jogo conta com suporte para mouse e teclado, mas sua configuração de teclas usa muitos atalhos de controle e não separa ações corretamente, fazendo o uso de mouse e teclado ser extremamente desconfortável mesmo para quem se acostumou com jogos de ação sem precisar de um controle.
Quando se trata da história, Scarlet Nexus conta um mundo pós apocalíptico onde criaturas chamadas de “Outros” aparecem de uma nuvem misteriosa que envolve a Terra. A defesa da humanidade não vem exatamente de tecnologia ou armamentos, mas sim de potenciais dormentes de humanos chamados psiônicos que manifestam diferentes formas de poderes com certos equipamentos potencializadores de suas capacidades cerebrais.
No aspecto de narrativa há muito o que se falar tanto em positivos quanto negativos. Começando pelos positivos, sua ambientação e descrição do mundo é interessante. Cenários pós-apocalípticos em ficção cientifica não é exatamente algo raro de se encontrar, mas muito do que Scarlet Nexus faz é diferente o suficiente para chamar a atenção. Um certo cuidado foi dado na construção desse mundo e a explicação de sua origem. Apesar de não ser nada revolucionador, sempre é satisfatório ver um mundo que pareça crível e interessante de se explorar. Outras qualidades da narrativa são os eventos de socialização com os integrantes do esquadrão da OSF. Os membros da equipe têm habilidades distintas e uma história própria onde muitas delas são clássicos clichês de animes, mas a execução é boa o suficiente para ser divertido, fora alguns momentos que podem ser genuinamente surpreendentes por fugir um pouco da norma. Yuito e Kasane também fazem parte dessa definição, são personagens completos com personalidade e passado próprio, ou seja, não há quaisquer opções de diálogo nesses episódios ou em qualquer momento na história. Em geral isso acaba sendo um positivo pois evita um dos maiores problemas em JRPG que são extremamente óbvios em sua ilusão de escolha (como Persona 5 te dando 3 respostas diferentes que são sinônimos entre si). As vezes há momentos em que a escrita faz personagens agirem de forma irracional para avançar a história, mas felizmente não é uma ocorrência tão comum.
Por outro lado, as side-quests estão entre as piores que o gênero já fez. Entre capítulos é possível pegar certos pedidos de cidadãos ou outros soldados, seus objetivos são sempre uma de duas opções: “Entregue X item” ou “Derrote X inimigo com Y golpe”. Alguns desses requer golpes extremamente ineficientes que o jogador possa optar por não pegar por não ser condizente com o seu estilo de jogo, efetivamente trancando a quest até o endgame onde se tem pontos os suficientes para pegar quase todas as habilidades. Ou é possível pular essa parte do conteúdo completamente também, as recompensas são ínfimas e as histórias dos pedidos são tão interessantes como um NPC de MMO pedindo para você matar 10 mobs fora da cidade.
De uma forma geral a história poderia ser boa, mas tem um péssimo ritmo que faz com que as coisas pareçam mais complicadas do que realmente são. Os primeiros momentos do jogo te bombardeiam com informações do mundo de Scarlet Nexus, depois se passa alguns capítulos sem nada acontecer, de repente é despejado exposição no jogador com várias reviravoltas, terminologias e novos conceitos. E mesmo passando a confusão e analisando com calma, ainda não é uma história tão impressionante para se dizer que essa apresentação é justificada.
Em suma, Scarlet Nexus tinha um enorme potencial para ser uma das surpresas do ano e estar entre os melhores jogos lançados, porém uma mistura de boas e péssimas idéias o colocam em uma posição bem mais modesta. É um dos melhores jogos de anime que a Bandai lançou sem ser da série Tales of, mas ainda não é espetacular.
PROS:
- Combate divertido;
- Um cenário pós-apocalíptico interessante;
- Personagens carismáticos;
- Boa progressão de poderes;
- Algumas cenas ótimas.
CONS:
- Péssimo ritmo narrativo;
- História desnecessariamente convoluta;
- Side quests extremamente entediantes e esquecíveis;
- Péssimo lock-on;
- Péssimo controle para mouse e teclado.
PLATAFORMAS:
- PC – Steam (Plataforma analisada);
- PlayStation 4/5;
- Xbox One / Series X / Series S.
NOTA: 7.5/10
A melhor forma de definir Scarlet Nexus seria um “RPG de Play2 da nova geração”. Não digo isso como algo negativo, a simplicidade e carisma desses jogos era sem igual e eu não acho que nenhum jogo moderno conseguiu replicar bem ainda. É ótimo ter uma história mais linear e focada, mas também é impossível não pensar como ela poderia ter sido mais bem executada. Na época do PS2 não nos preocupávamos com isso, mas é inegavelmente um diferencial para os jogos que a tem. Além do mais, o pulo de preço desde então faz com que a gente olhe as coisas com uma visão bem mais crítica, Scarlet Nexus é um jogo que eu recomendaria como “legalzinho” pra quem gosta da estética, mas com o preço atual (R$200 Steam / R$ 280 consoles) fica difícil dizer que esse preço é justificado. Mas vale a pena ficar de olho nas promoções se interessar.