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The Great Ace Attorney Chronicles – Elementar meu Caro Júri!

A série Phoenix Wright é praticamente um ponto fora da curva no catálogo da Capcom. Afinal de contas, uma Visual Novel não parece algo que uma empresa geralmente conhecida por qualidade de jogabilidade acima da história iria fazer. Independente disso, era exatamente o que Shu Takumi queria. Após terminar sua parte em Dino Crisis 2 ele teve uma oportunidade de criar qualquer jogo que quisesse contanto que fosse em seis meses, e esse era o momento que Takumi estava esperando para um jogo de mistério e aventura que tinha em mente. Um jogo sobre advocacia não parece emocionante, mas nas palavras de seu próprio criador: O foco do jogo não é a lei nem realismo. O ponto é resolver quebra-cabeças divertidos e sentir o prazer de pegar uma mentira com provas concretas.”

Tal direção é a melhor descrição sobre o que esperar do jogo para quem nunca teve contato com a série, e The Great Ace Attorney é um ótimo ponto de partida para novatos tanto quanto uma ótima continuação para fãs estabelecidos. O jogo não tarda em demonstrar sua excentricidade e acomodar o jogador em uma história que segue as regras próprias. Afinal de contas, um julgamento real é extremamente mundano e raramente traria as emoções que um episódio de Ace Attorney proporciona.

Em outras palavras, mesmo a história sendo o foco principal do jogo, e de usar vários fatos históricos e um ambiente familiar, também é uma história onde o jurado traz bules de chá, telégrafos, máquina de escrever, ratos e até mesmo facas. Todos os personagens, protagonistas, antagonistas e os envolvidos no caso agem como seu típico anime exagerado, é quase como se o processo legal fosse uma batalha de Yu-Gi-Oh. Passando essa estranheza, há uma excelente história de mistério que faz uso de todos os pilares do gênero fazendo uso dos artifícios de um videogame para nos colocar na posição do protagonista. Outra coisa importante de se mencionar é que a série é uma light visual novel, ou seja, sua história é extremamente linear. O jogo eventualmente te apresenta escolhas, mas é impossível mudar o rumo dos eventos. Pode se dizer que é um livro com alguns quizzes sobre a história de quando em quando.

The Great Ace Attorney conta a história de um antepassado de Phoenix Wright (Ryūichi Naruhodō na versão japonesa), Ryunosuke Naruhodō, durante o final da era Meiji/Vitoriana (perto de 1900). O jogo começa em uma situação precária familiar para fãs da série, tendo que se defender na corte de um assassinato que foi armado para te incriminar. Ryunosuke e seu amigo Kazuma Asogi trabalham nesse caso servindo de tutorial para o resto do jogo, e partem para estudar advocacia em Londres, “a capital do mundo”, para que possam aplicar seus conhecimentos na corte ainda pueril do Japão na era Meiji.

O jogo foi originalmente lançado em 2015 no Japão para 3DS e não foi localizado na época. Uma continuação foi lançada em 2017 que também não teve uma versão global. Chronicles não é somente um remaster desses jogos com conteúdo adicional, é também a primeira vez que o jogo dá as caras no ocidente. A série sempre teve uma relação complicada com a localização, traduzindo nomes e movendo todas as referências a cultura japonesa para que o jogo se passasse em Los Angeles ao invés do Japão. TGAA ainda teve algumas alterações da versão original (que eram especuladas ser o motivo da relutância em localizar os jogos desde início) porém nada que altere o significado ou tom das cenas. O choque de cultura que Dual Destinies ficou conhecido não está presente nessa localização.

A coletânea então contém dois jogos de 5 episódios cada que duram em volta de 60 horas em conjunto. Além de uma remasterização gráfica, o jogo contém conteúdo adicional na forma de pequenas histórias adicionando um pouco mais de contexto na personalidade e motivação dos personagens e com várias artworks e comentários dos desenvolvedores sobre vários aspectos da criação dos elementos dos jogos.

Os jogos trazem algumas novidades a série como a “Dança de Dedução” e a “Verificação dos Fatos”. A dança de dedução toma uma porção da parte investigativa contendo as famosas deduções do detetive Sherlock Holmes (que foi chamado de Herlock Sholmes na localização por motivos de direitos autorais) em analisar a reação das pessoas e revelar suas motivações e segredos. Sholmes é consideravelmente diferente de sua versão original, parecendo até mesmo um charlatão feito para parodiar o personagem de Arthur Conan Doyle. Contudo toda boa paródia precisa ter um profundo conhecimento daquilo que está debochando, o que resulta em um personagem imprevisível, porém cheio de referências para quem conhece as obras originais. A verificação dos fatos tem o protagonista avaliando o motivo que o júri toma a decisão de “culpado” e procura falácias e inconsistências para pedir que o julgamento continue até os fatos estarem corretos.

A série também tem uma leve mudança dos casos contidos onde todos terminam com o verdadeiro culpado sendo exposto e tendo um colapso mental. Apesar desse elemento ainda estar presente, alguns casos simplesmente servem para suplementar um caso maior que dura pelos dois jogos. O resultado é um jogo que não só usa todo o surrealismo e exagero que fez Ace Attorney ficar tão popular quanto é hoje, também faz uso de uma história de mistério muito bem contada que é legitimamente intrigante de se adivinhar antes da hora.

Em suma, The Great Ace Attorney: Chronicles não é um jogo perfeito nem um que irá agradar a todos, mas é único e excelente no que faz.

PROS:

  • Excelente narrativa;
  • Ótima trilha sonora realçando a tensão de momentos cruciais;
  • Boa seleção de extras, conteúdos adicionais e comentários de desenvolvimento;
  • Referências e paródias dos trabalhos de Arthur Conan Doyle dão um charme a mais na história;
  • Uma evolução da série Ace Attorney sem perder sua essência.

CONS:

  • Menus e diálogos são um pouco lentos de se navegar;
  • Excentricidade exagerada pode desagradar quem prefere uma história mais realista.

PLATAFORMAS:

  • PC – Steam (Plataforma analisada, chave gentilmente cedida por Capcom);
  • Nintendo Switch;
  • PlayStation 4/5 (por retro);

NOTA: 9/10

Pra quem me conhece sabe que eu sempre fui fã dos jogos da Capcom. Sua filosofia desde sempre pareceu ser foco em gameplay antes de mais nada, com personagens carismáticos e bem desenhados para chamar a atenção, ao custo de sempre ter uma história e narrativa péssima. Resident Evil, Devil May Cry, Megaman, Monster Hunter, Street Fighter, Strider, praticamente tudo se encaixa nessa diretriz. Phoenix Wright sempre foi a exceção que trocava “gameplay” e “narrativa” de lugar, e a série TGAA tem uma narrativa tão afiada e cativante quanto DMCV tem fluidez de combos. Seus casos são completamente surreais e, no papel, totalmente impossível de serem levados a sério. Exatamente por isso que é impressionante que o jogo ainda prenda seu interesse com a mesma força que um bom filme ou livro de detetive.

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