Atomic Heart – Quase um sucesso.
Atomic Heart é um projeto fortemente inspirado por outros jogos BioShock, Fallout, e survival-horrors como Resident Evil e Dead Space. A história se passa em um mundo alternativo logo após o término da Segunda Guerra Mundial que – assim como Fallout – é extremamente avançada cientificamente.
A história é vista através dos olhos do Major Sergey Nechayev ou Agente P-3, um veterano da guerra que foi mortalmente ferido e eventualmente salvo pelo cientista Sechenov através de vários procedimentos ainda experimentais. Acompanhando o Major, a Inteligência Artificial “CHAR-les” embutida em sua luva serve como a principal fonte de interações no jogo.
Fazendo parte de um subgênero não tão comum, Atomic Heart logo de cara já serviria para quem procura mais experiências tipo BioShock, Metro, ou Prey ’17. Seu gameplay é primariamente um FPS, mas com um sistema de inventário a la Resident Evil e algumas formas de customização do arsenal e poderes.
Apesar disso, o jogo comete algumas falhas dentro do arquétipo de “ImmSim”. Existem poucas alternativas para combate fora uma investida de cara, explorar o cenário oferece pouco além de suprimentos para combate, e praticamente não existe decisões significativas que o jogador possa fazer para alterar a história. Pelo menos é possível ter um certo grau de não-linearidade e os segredos espalhados realmente exigem atenção e criatividade.
O gameplay do jogo de uma forma geral é competente no que faz, mas não há nada de realmente novo. Não que isso signifique que não seja bom. O combate é simples, porém bem divertido. O simples uso de um sistema de esquiva já dá uma certa dinamicidade que vários outros shooters não tem. As batalhas são encorajadas em lugares abertos, o desafio não te força a recuar e se esconder. Também há um foco pesado em combate melee, especialmente na primeira metade quando recursos ainda são limitados e escassos.
Não é um jogo que faz uso excessivo de arenas de combate, mas quando ele faz em certos momentos chave, um esforço especial foi dado em fazer com que seja memorável. Todos os chefes que enfrentamos pela história tem uma arena com um design impecável e uma trilha sonora excelente. Os ataques são completamente justos, é exigido mais do que somente andar para trás e atirar do jogador, e a música amarra tudo junto em algumas das melhores boss fights que o gênero já teve.
E fora os momentos de ação, o arsenal de P-3 é altamente customizável. Para as armas há um sistema simples de crafting que está entre os melhores no que se trata de simplicidade e implementação. Apesar de não existir muitas opções para armas no começo, mais para frente é possível desmontar qualquer arma e receber os materiais dela de forma integral.
Com isso você é encorajado a tentar upgrades e combinações de armas diferentes. Achou muita munição de Kalash, mas está usando uma pistola? É só questão de desmontar e realocar todos os recursos para uma nova arma. Nada é perdido e não há punição em fazer isso.
Além desse sistema, também existe uma simples skill tree para Charles que consiste primariamente das habilidades especiais. A primeira habilidade – Shok – é liberado pela história e sempre está equipada. Justamente por isso é uma das peças envolvida em alguns puzzles e segredos. Depois disso é possível liberar várias outras habilidades como uma telekinese que desabilita inimigos ou um escudo protegendo contra danos.
Esse lado é gerenciado pelos “Neuropolímeros”, itens que são obtidos de todos os inimigos e alguns containers. Assim como as armas, é possível realocar esses pontos a qualquer momento. Seja de habilidades ativas para certas melhorias passivas ou vice-versa. Experimentação e variedade é encorajado, e você nunca é “punido” por pegar uma habilidade ou upgrade que não gostou.
O maior problema do jogo no lado de gameplay são suas sessões de open world. O mundo não é nada grandioso onde alguém vai citar “mapas gigantes” ou “horas explorando” como um ponto focal, mas infelizmente é meio fora de mão do mesmo jeito. O mundo aberto não possui nada de interessante fora vários contêineres que raramente vão te recompensar com um esquemático para uma nova arma ou item. Inimigos ficam reaparecendo de forma constante, e o próprio design não é tão interessante para incentivar a exploração de áreas fora do objetivo.
Espalhado nesse mapa existem algumas instalações que contém quebra-cabeças ou arenas de plataforma que possuem ótimas recompensas. Esses laboratórios de teste são excelentes conteúdos adicionais e vale o tempo de fazê-los, porém quebram completamente o ritmo da história e são cansativos pela distância entre um e outro. O mundo aberto mal toma 10% da totalidade do jogo, mas é de longe a pior parte do pacote.
Partindo para a história e estética do jogo, tudo fica bem mais complicado de se definir. Aqui a qualidade flutua entre extremos, e por causa disso se torna muito mais subjetivo sobre qual parte se sobressai. Os primeiros momentos são excelentes no que se trata de ambientar o jogador na atmosfera. O festival do lançamento da Kollectiv é tudo que se esperaria de um jogo inspirado por BioShock. É uma forte introdução, talvez até o ponto mais alto do jogo. Enquanto o jogador é mantido dentro de complexos científicos e restrito por corredores ele mantém esse nível de qualidade. Porém – novamente – o mundo aberto chega e quebra muito da tensão criada durante todo esse tempo.
O mesmo acontece com a história. A ambientação de uma Russia pós Segunda Guerra e entrando nas tensões da Guerra Fria só que com robôs e biotecnologia avançada é uma fundação única entre jogos. E ao mesmo tempo, é uma história que não faz muito além disso. Há uma boa gama de maquinações políticas por trás dos eventos de Atomic Heart, mas a maior parte delas mal recebe mais do que algumas linhas de diálogo e pouquíssima exposição.
E de longe, o que mais sofre com esses problemas de oscilações, é o diálogo. O protagonista fala como um adolescente rebelde na maior parte das vezes, a primeira metade do jogo é quase inteiramente consistida dele xingando coisas e pessoas, e de forma geral é simplesmente rude com tudo e todos. Mesmo servindo alguns propósitos no enredo, é simplesmente mal executado.
Não é só o P3 que é responsável pelos piores momentos de diálogo do jogo também, toda cutscene ou conversa com um NPC é uma roleta russa (heh) entre algo que vale a pena a sua atenção, e algo que soa extremamente amador e juvenil. Momentos onde Atomic Heart resolve ser chulo sem qualquer motivo aparente são infelizmente freqüentes. Se pegar as melhores partes, há uma história um tanto quanto interessante para se dissecar, mas somente se você conseguir tolerar ou ignorar todas as vezes que ele desliza.
E é claro, é impossível mencionar qualquer coisa sobre esse jogo sem a controvérsia com o estúdio Mundfish (por ser majoritáriamente Russo) e a guerra na Ucrânia. Um jogo que se passa em uma União Soviética com planos de expandir sua influência para o resto do mundo não é algo que é fácil de passar despercebido. Não há qualquer indício de malícia ou segundas intenções da Mundfish, mas é impossível não atrair atenção pela nacionalidade do estúdio.
Sua maior inspiração é claramente BioShock, com algumas referências nada sutis até apontando para isso. Uma boa parte do que fez o jogo ser um clássico foi justamente pegar um modelo político e o colocar no centro de uma história complexa. É um “e se” levado ao extremo que é ótimo de se discutir e analisar.
Só que essa situação é decididamente mais sensível e complicada do que qualquer coisa que BioShock se propôs a fazer, e é impossível não notar essa sombra permeando todo segundo de Atomic Heart. Apesar dos mencionados pontos altos que a história pode ter, falta um certo “que” para ligar tudo junto em um universo que seja tão legal de se explorar. É um jogo que pegou um tema extremamente político e não fez nada com isso.
Honestamente, não dá para se dizer que seja algo ruim dadas as circunstâncias. Pender para qualquer lado marcaria o fim para o estúdio de um jeito ou de outro, e talvez até algo muito mais grave que isso. É uma infeliz circunstância que o limita de ser o novo BioShock, e o faz ser só “OK” no melhor dos casos.
Em suma, Atomic Heart vale a pena?
Para quem gosta de shooters um pouco inconvencionais, Atomic Heart tem um valor nato em seu gameplay. Não há nada de novo ou extremamente bem-feito que valha a pena jogar o quanto antes, mas ele é no mínimo competente em tudo que faz. Há alguns problemas de otimização e crashes eventuais, mas nada que o gênero como um todo não tenha sofrido ao tentar alguns sistemas expansivos e abertos. A história, estética e o lado mais artístico do jogo é impossível de se quantificar. Existem ótimas idéias, existem péssimas idéias, e nenhuma delas é realmente elaborada além do momento que são mencionadas pela primeira vez. No geral, é um jogo que tem os seus momentos, mas ratia demais para fazer valer o seu preço de AAA. Mas vale a pena ficar de olho.
PROS:
- Combate divertido;
- Excelente trilha sonora;
- Uma história um tanto quanto interessante;
- A estética e atmosfera é excelente;
- Sistema de customização expansivo e maleável;
- Um dos poucos jogos no estilo de Bioshock.
CONS:
- O protagonista dá nos nervos pela maior parte do jogo;
- Diálogo consegue ser muito ruim as vezes;
- Desnecessariamente chulo com freqüência (não abra a geladeira com família por perto);
- Seções open-world são genéricas e tediosas.
PLATAFORMAS:
- PC – MS Store (Gamepass, plataforma analisada), Steam;
- PlayStation 4/5;
- Xbox One /Series.
NOTAS:
Jogabilidade: | Qualidade dos controles | 9 |
Design (Dificuldade, Level, Criatividade) | 7 | |
História: | Enredo | 9 |
Narrativa | 5 | |
Arte: | Gráficos | 7 |
Direção artística | 9 | |
Audio: | Efeitos Sonoros | 8 |
Trilha Sonora | 9 | |
Port | Estabilidade | 7 |
Otimização | 7 | |
NOTA FINAL: | 7.7 |
Atomic Heart anda uma linha fina entre um jogo incrível e um jogo horrível. É um jogo com uma personalidade própria, mas ao mesmo tempo as vezes parece mudo e incompleto. Talvez no futuro seja algo interessante de se revisitar e aprender com seus erros, não necessariamente só no contexto de design de um jogo. Mas por hoje, existem boss fights com Mick Gordon tocando de fundo.